Votar para quê? O que
falta do calendário de transição
Por António Sampaio/Lusa
Segunda-feira, 27 de Agosto de 2001
A acreditar nas opiniões de alguns
dirigentes e nas indicações de sondagens realizadas
em Timor-Leste, um número significativo de eleitores
timorenses vai às urnas sem saber exactamente para
que serve o voto.
Muitos não sabem que da sua decisão sairá
a configuração da primeira estrutura eleita
em Timor-Leste, a Assembleia Constituinte, a quem cabe, num
debate para que foram reservados 90 dias, aprovar a Constituição.
Não sabem que o voto não elegerá um presidente,
como muitos pensam, nem tão pouco um órgão
legislativo, já que a decisão sobre esse aspecto
apenas cabe aos membros da Constituinte.
Na véspera do dia de reflexão nacional antes
do primeiro exercício livre de democracia, alguns observadores
sugerem que isso até é de esperar, com um alto
índice de analfabetismo, a complexidade do processo
e o facto de que a campanha ignorou questões constitucionais
para falar de temas mais adequados a voto legislativo.
Outros observadores recordam que até nos países
mais desenvolvidos e mais habituados a actos eleitorais este
processo seria complicado de explicar, sendo afinal único
na história de uma nação.
Muitos em Portugal podem, por exemplo, não se recordar
que a nação também já elegeu uma
Assembleia Constituinte, habituados como estão a ver
outros temas nas bocas dos candidatos ao governo.
Em Timor-Leste o processo ainda se torna mais complicado visto
ser apenas o primeiro dos últimos passos antes da independência,
um objectivo com data por marcar e com um percurso formalmente
por definir.
O calendário que ainda falta cumprir inclui não
só a aprovação da constituição
mas a definição sobre se haverá ou não
legislativas ou se a Assembleia Constituinte passará
simplesmente a Assembleia Legislativa ou Parlamento Nacional.
Depois há que realizar eleições presidenciais
- se assim a constituição ditar, o que parece
muito provável - e finalmente marcar a data da independência,
actualmente apontada para Maio ou Junho do próximo
ano.
Paralelamente ao processo político há ainda
a transição administrativa a considerar, incluindo
a formação de um novo executivo, formalmente
sob controlo da ONU até à independência.
Essa transição administrativa obriga a determinar
se as Nações Unidas concluem ou não ou
actual mandato, com data final de 31 de Janeiro e sob o título
de UNTAET, e se posteriormente haverá nova missão,
talvez sob o título de Missão de Apoio das Nações
Unidas em Timor-Leste (UNSMET).
Em curso estará um redução significativa
da presença internacional que deverá traduzir-se
num corte de quase 75 por cento dos funcionários civis
da ONU e até 20 ou 30 por cento das forças militares
ou policiais.
Esses números serão definidos em Outubro, quando
o Conselho de Segurança analisa um relatório
sobre o processo, dois meses antes do que se espera possa
ser a penúltima reunião de doadores, marcada
para Oslo. A última será em Díli em 2002.
Todo o processo arranca formalmente depois do voto e após
a contagem estando a posse dos membros da Constituinte agendada
para 15 de Setembro, na mesma altura em que Sérgio
Vieira de Mello, o administrador transitório, deverá
anunciar a estrutura e composição do novo executivo.
Vieira de Mello manterá o poder executivo, administrativo
e judicial mas parte das funções já serão
canalizadas para o executivo e até para a Constituinte
que pode vir a analisar alguns regulamentos estatais.
Caberia ao brasileiro mandar em Timor-Leste até à
data da independência.
A cumprir-se o calendário inicialmente previsto a constituição
final seria adoptada em Dezembro, fazendo a época das
chuvas - últimos e primeiros meses do ano - adiar as
presidenciais para Março ou Abril e marcar a independência
para Maio ou Junho.
Alguns partidos, o caso da Fretilin, apontam para um processo
mais acelerado, especialmente se conquistarem a maioria que
prevêem, 85 por cento dos votos.
Nesse cenário apontam a aprovação da
constituição até Novembro, a realização
de presidenciais no início do penúltimo mês
do ano e a declaração da independência
já para 28 de Novembro.
Seja qual for o cenário, e depois do ritmo acelerado
dos últimos dois anos, Timor-Leste vai continuar a
apressar o passo.
|