ASDT garante maioria de dois
terços à Fretilin
Por Luciano Alvarez,
em Díli
Sexta-feira, 07 de Setembro de 2001
A Fretilin ficou a quatro deputados da maioria de dois terços
que desejava para aprovar a futura Constituição
de Timor-Leste sem ter de negociar com ninguém, mas
já não há dúvidas de que tem a
maioria qualificada da futura Assembleia Constituinte nas
suas mãos. Ontem, Xavier do Amaral, líder da
Associação Social Democrática de Timor,
a quarta força política mais votada, assegurou
que não votará "em nada" contra o
seu anterior partido e também já o disse aos
dirigentes da Fretilin. Assim como também já
não há dúvidas sobre quem será
o futuro primeiro-ministro do Governo de transição:
Mari Alkatiri, secretário-geral da Fretilin e grande
estratega do partido.
O anúncio dos resultados finais das
eleições do dia 30 não motivaram festa
nas ruas de Díli. A Fretilin pediu aos seus militantes
e apoiantes para se conterem até ao dia seguinte ao
da divulgação oficial dos resultados, e nessa
altura será feita a festa. Mas a tranquilidade mais
uma vez vivida em todo o território contrastou com
a agitação no meio político. Conferências
de imprensa, encontros entre os partidos e a Comissão
Eleitoral Independente (CEI), declarações conjuntas
e individuais e a divulgação dos resultados
totais causaram um dos dias mais agitados de todo o processo
eleitoral.
Todas as declarações convergiram
em três pontos: nos parabéns à Fretilin
pela vitória, a todos os partidos pela sua participação
serena no processo eleitoral e ao povo de Timor pela maturidade
que revelou. "Há neste momento muitos países
com muitos anos de democracia que devem estar com inveja deste
povo extraordinário", sintetizou o administrador
da ONU no território, Sérgio Vieira de Mello.
Claro que os principais dirigentes da Fretilin
sorriam mais que os de todos os outros partidos. E tinham
razões de sobra para isso. Embora não tivessem
assegurado a maioria de dois terços na Assembleia Constituinte,
a sua vitória tinha sido esmagadora. E já sabiam
também que essa maioria estava assegurada com os cinco
deputados eleitos pela ASDT. Xavier do Amaral já dera
a entender que apoiaria a maioria da Fretilin na Assembleia,
e ontem deixou-o mais claro que nunca. "Convergimos em
quase tudo, por isso não há razão para
que vote contra a Fretilin em nada. Vamos estar sempre ao
lado da Fretilin na elaboração da Constituição",
afirmou ao PÚBLICO.
Mari Alkatiri, que passou o dia dividido entre
entrevistas e encontros formais e informais, tinha razões
redobradas para estar mais feliz que todos os outros. Muitos
dos que a ele se dirigiam, desde jornalistas a membros de
outros partidos, já o tratavam por primeiro-ministro.
E Alkatiri, enquanto dizia que ainda não era bem assim,
sorria sem parar. Embora o negue, a verdade é que,
segundo apurou o PÚBLICO, o secretário-geral
já tem assegurada a chefia do Governo. O Comité
Central da Fretilin, ainda que oficiosamente, já o
decidiu e Sérgio Vieira de Mello também já
lhe fez o convite.
As conversas entre o administrador da ONU e
a Alkatiri já ultrapassaram essa fase, e estão
ao nível da composição do futuro Governo
de transição, onde, segundo asseguram vários
dirigentes do partido que ganhou as eleições,
"também não há divergências".
Governo anunciado depois de dia 10
Com todos os partidos satisfeitos, com excepção
da UDT, que continua a contestar as eleições,
todos se viravam para o povo. Para os elogios ao povo, à
sua serenidade e maturidade. Foi isso que fizeram Sérgio
Vieira de Mello e Xanana Gusmão numa conferência
de imprensa conjunta ao início da tarde, onde divulgaram
também um documento assinado pelos dois e por José
Ramos-Horta, onde apelavam aos partidos a que continuem a
respeitar o pacto de unidade nacional assinado pela maioria
dos partidos antes das eleições.
"Gostaria de agradecer a todos os timorenses
que fizeram desta eleição um momento verdadeiramente
histórico. Timor-Leste contrariou mais uma vez os cépticos
e deu outra lição ao mundo sobre a sua maturidade
e o seu sentido de responsabilidade democrática",
disse Vieira de Mello. Xanana Gusmão, embora menos
eloquente até porque se encontrava doente, saudou também
de forma generosa os partidos e o povo.
Vieira de Mello tinha também uma mensagem
para deixar aos partidos que não elegeram deputados,
ou que estão desapontados com os resultados. E para
tal recorreu a Churchill: "A democracia é talvez
o pior dos sistemas e das formas de governo, com excepção
de todos os outros que foram testados anteriormente."
E tinha ainda uma outra mensagem, desta vez
para as mulheres timorenses: "Não alcançámos
o nosso objectivo, que era eleger um terço de mulheres,
mas todos temos que reconhecer que 27 por cento é um
bom augúrio para a emancipação política
e social da mulher timorense. Parabéns a todas as que
foram eleitas."
Xanana Gusmão, questionado pelos jornalistas,
diz só ter visto um aspecto negativo em todo o processo
eleitoral. "Tivemos pouco tempo para fazer as coisas
como nós queríamos. Faltou tempo para ver mais
coisas. Mas a perfeição é impossível
quando se faz alguma coisa", afirmou, debilitado e incapaz
de travar uma tosse constante.
Vieira de Mello, já no final, revelou
que no dia 10 serão revelados oficialmente os resultados,
e que nos dias seguintes pretende anunciar os nomes dos homens
e mulheres que vão formar o segundo Governo de transição.
No dia 15, depois de uma deslocação à
Indonésia, dará posse à assembleia que,
de acordo com o que está agendado, deverá aprovar
a Constituição no prazo de três meses.
A independência, assegurou ontem novamente Sérgio
Vieira de Mello, pode ser declarada a partir de Maio de 2002.
A democracia timorense avança
agora a grande velocidade e na mais perfeita tranquilidade.


|