Xanana Gusmão vai integrar
o próximo Governo
Por Luciano Alvarez, em Díli
Segunda-feira, 3 de Setembro de 2001
O líder histórico
da resistência timorense aceitou trabalhar com Sérgio
Vieira de Mello no segundo Executivo de transição.
Quanto aos amigos, preocupados com a sua indecisão
sobre a Presidência, aconselham-no a assumir de vez
uma posição de estadista. E a "deixar de
brincar aos fotógrafos".
Xanana Gusmão já aceitou o convite
que lhe foi feito por Sérgio Vieira de Mello para desempenhar
um cargo na segunda estrutura governativa de transição,
que será nomeada pouco depois de conhecidos oficialmente
os resultados das eleições de 30 de Agosto.
O líder histórico da resistência terá
um cargo acima e independente do Executivo, trabalhando lado
a lado com Vieira de Mello, numa posição que
é vista como uma preparação de Xanana
para sua futura Presidência da República de Timor-Leste
independente.
Segundo apurou o PÚBLICO, o líder
histórico da resistência, que no sábado
se recusou a revelar se iria desempenhar algum cargo na futura
estrutura governativa, irá ser o primeiro responsável
pelas questões de Defesa e planeamento, prestando especial
atenção a problemas ligados reconstrução
do território. O "sim" de Xanana a Vieira
de Mello tranquilizou muitos dos seus amigos e colaborados
próximos que não têm escondido as suas
preocupações pelo facto de Xanana continuar
a afirmar em público e privado que não deseja
ser presidente da República, depois de já ter
anunciado a sua candidatura no passado dia 25.
"Xanana tem de deixar de brincar aos fotógrafos
e assumir-se de vez como estadista", disse ao PÚBLICO
um dos seus mais próximos colaboradores, acrescentando
que as indecisões de Xanana podem ter o efeito contrário
ao que pretendido quando ele anunciou a sua candidatura antes
da realização das eleições para
a Constituinte: "Passar a vida a dizer que não
era seu desejo ser presidente, já depois de o ter anunciado,
pode baralhar as pessoas. E em vez de tranquilizar pode criar
intranquilidade e dúvidas."
Sim, não, talvez
No dia em que anunciou a sua candidatura à Presidência
da futura República de Timor-Leste, Xanana Gusmão
deixou claro que o fazia contra a sua vontade. Acrescentou
ainda que não se sentia a pessoa mais indicada, que
estava cansado e que o seu sonho era ir "cultivar abóboras
e criar animais". Mais tarde, admitia mesmo que avançava
pressionado e em nome da tranquilidade nas eleições
para a Assembleia Constituinte do passado dia 30. Daí
para cá, nas muitas entrevistas que deu para o mundo,
não se tem cansado de o repetir. No sábado,
numa conferência de imprensa sobre o acto eleitoral,
voltou a afirma-lo. Desta vez indo ainda mais longe, ao garantir
que ainda ia "tentar convencer o povo a encontrar outra
pessoa". "Acho que não sou o mais indicado",
afirmou mais uma vez, com um ar desalentado.
Segundo revelaram alguns dos seus amigos e
colaborados que aceitaram falar sobre esta questão
ao abrigo do anonimato, o líder histórico da
resistência nunca quis, de facto, avançar para
a presidência da República. "Disse-o várias
vezes e falava verdade", asseguram.
Só que, em Maio último, Xanana
Gusmão, foi convencido que não tinha alternativa
depois de várias conversas a nível internacional,
nomeadamente com o presidente português, Jorge Sampaio,
e com o secretário de estado norte-americano, Colin
Powll. "Na altura, ele até ficou entusiasmado",
refere um dos seus amigos.
O "timing" para o anúncio
não ficou, porém, definido. Sérgio Vieira
de Mello e Ramos-Horta, em nome da estabilidade no processo
eleitoral, bem como o facto de alguns partidos estarem a usar
o seu nome campanha eleitoral, convenceram Xanana Gusmão
a avançar antes das eleições.
Por isso, muitos dizem não ter explicações
"para esta indecisão", este "sim hoje
e não amanhã". "Xanana é muito
emocional. Deixa-se levar pelas suas emoções
e depois complica as coisas", diz um dos seus colaboradores,
lembrando que o mesmo já tinha acontecido quando o
hoje presidente da Associação de Veteranos da
Resistência abandonou o ex-Conselho Nacional (uma espécie
de parlamento transitório criado pela UNTAET), "num
processo com avanços e recuos, desmentidos e confirmações
que só criou confusão e instabilidade".
Ninguém tem, porém, dúvidas
em afirmar que Xanana não pode recuar na sua candidatura
à Presidência. Que tem de o fazer, "quer
goste quer não", em "nome do povo, da estabilidade
e da credibilidade a nível internacional".
|