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  O processo está viciado desde o inicio. [...] Algumas destas irregularidades podem mesmo ser consideradas crimes graves contra as autoridades", afirmou
 
   

UDT Pede Julgamento da Fretilin por Crimes de 75
Por Luciano Alvarez, em Díli
Domingo, 2 de Setembro de 2001

João Carrascalão contesta eleições

O líder da União Democrática Timorense fez ainda acusações à UNTAET

A União Democrática Timorense (UDT) pediu ontem o julgamento de alguns dos actuais dirigentes da Fretilin "pelos crimes" que diz que estes cometeram em 1975. Numa conferência realizada em Díli, João Carrascalão, presidente da UDT, embora sem referir qualquer nome, afirmou sempre que estava a falar "de gente da Fretilin" quando pediu "o julgamento dos criminosos" e acusou ainda a Administração Transitória das Nações Unidas em Timor-Leste (UNTAET) de estar "a promover alguns deles". João Carrascalão contestou também as eleições de dia 30, apresentando o que chamou de "irregularidades graves" e "crimes contra a autoridade". Declarações que incendiaram como ainda não tinha sido feito o processo eleitoral em curso e deixaram alguns dos responsáveis da ONU à beira de um ataque de nervos.

O presidente da UDT começou por ler um comunicado que enviou à UNTAET e à Comissão Eleitoral Independente (CEI) onde aponta 18 "irregularidades no processo eleitoral" num apanhado "feito, para já, apenas em Díli". "Casos", que segundo o presidente do partido passam pela "falta de juramento de agentes da CEI", por estações de voto "sem qualquer vigilância, pela "reabertura forçada de vários centros de votação" depois da hora do seu encerramento e "recusa sistemática de aceitação de reclamações por parte dos Agentes Eleitorais Distritais".

"O processo está viciado desde o inicio. [...] Algumas destas irregularidades podem mesmo ser consideradas crimes graves contra as autoridades", afirmou.

Indo de acusação em acusação, João Carrascalão não poupou ninguém, desde a UNTAET à CEI e a até "todos os observadores internacionais" que estiveram em Timor-Leste e que afirmaram que as eleições decorreram sem incidentes de maior. A tudo chamou "falcatruas" e, embora tivesse dito que iria aceitar o resultado das eleições, referiu várias vezes que elas "estão viciadas desde o primeiro momento e a até talvez tenham sido fraudulentas". Por tudo o que referiu ameaça mesmo "recorrer aos tribunais". "Não foram umas eleições livres, nem justas, nem democráticas", acentuou.

"Não queremos criminosos a governar"
João Carrascalão dividiu a conferência de imprensa em duas partes, e, para a segunda metade, tinha guardado o pedido de "julgamento dos que cometeram crimes em 1974/75", durante a guerra civil que envolveu UDT e Fretilin. Afirmado que, "depois das eleições e antes da divulgação dos resultados" era a altura "falar no assunto", João Carrascalão começou por lembrar que "os crimes em Timor-Leste não foram só cometido depois do referendo de 1999". "A UDT não quer correr o risco de Timor-Leste vir a ser governado por indivíduos que cometeram crimes contra a humanidade. Pessoas que enterraram pessoas vivas e que cometeram massacres. Não queremos criminosos a governar Timor-Leste", afirmou.

Questionado sobre a quem se referia, recusou-se a avançar nomes, mas disse imediatamente que se estava a reportar a pessoas da Fretilin. "São pessoas da Fretilin. A UNTAET tem fechado os olhos e até tem promovido essas pessoas", afirmou, dizendo que "a partir de agora a segurança dos dirigentes da UDT está nas mãos da UNTAET", porque, revelou, já tem "recebido ameaças" e a administração da ONU "nada fez".

Muitas vezes ambíguos, o presidente da UDT disse estar "pronto para a reconciliação", mas "só depois de ser feita justiça" e assegurou que estas suas declarações "não são uma violação do pacto de unidade nacional" feito pelos partidos antes da realização das eleições de 30 de Agosto.

Admitiu ainda que "pode muito bem haver violência depois da divulgação dos resultados", afirmando que ao estar "desenterrar velhas questões não vai contribuir para isso". "Há coisas que pudemos esquecer e outras que não. Há milhares de pessoas da UDT que pedem que não me esqueça. (...) Não temos medo da confrontação, só queremos justiça", acrescentou.

Na sala da conferência de imprensa estavam vários elementos da UNTAET e da CEI que ouviram as declarações com espanto, saindo rapidamente assim que o encontro com os jornalistas acabou. Nenhum quis fazer declarações, mas numa troca de palavras entre eles uma frase foi audível: "Isto é uma irresponsabilidade."

No final da conferência de imprensa, vários militantes da UDT, dirigiram-se aos jornalistas, desafiando-os a irem ouvir as famílias "dos que foram mortos pela Fretilin em 1975".

Esta foi a primeira vez que um partido concorrente às eleições levantou questões dos tempos da guerra civil de 1975 e que uma força política vem levar questões "de irregularidades" no processo eleitoral, depois das Nações Unidas e todos os observadores internacionais presentes terem assegurado que tudo decorreu sem incidentes de maior.



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