Xanana avança para
presidência
em nome da serenidade eleitoral
Por Luciano Alvarez, em Díli
Domingo, 26 de Agosto de 2001
Timor-Leste já tem o candidato que todos queriam para
Presidente da futura república independente. Xanana
Gusmão, para alegria dos timorenses, revelou ontem
que é candidato, embora o seu desejo fosse só
o fazer depois de divulgados os resultados das eleições
da próxima quinta-feira. Xanana acabou por ceder às
pressões dos que lhe fizeram ver que anunciar já
a sua disponibilidade era vital para serenar a população,
os partidos políticos e diminuir as possibilidades
de violência entre as forças partidárias.
Xanana, porém, fê-lo pouco entusiasmado, afirmando
saber que não é "a pessoa mais indicada",
que está "muito cansado" e revelando que
o seu sonho para depois da independência era outro.
O mais que certo futuro Presidente queria antes ir "cultivar
abóboras e criar animais".
Xanana Gusmão foi fortemente pressionado por alguns
dos principais dirigentes políticos timorenses, nomeadamente
Ramos-Horta, e por altas individualidades da administração
da ONU em Timor-Leste para anunciar ontem a sua disponibilidade
para se candidatar à presidência da futura república.
Xanana, segundo apurou o PÚBLICO, não queria
fazer já o anúncio, mas em nome de uma eleição
tranquila e sem violência e para colocar fim às
especulações, aceitou os insistentes pedidos
que lhe foram feitos nos últimos dias. Timor-Leste
já tem o candidato a Presidente que todo o povo desejava,
ainda que Xanana tenha avançado de forma muito pouco
entusiasmada e revelando que não era esse o seu sonho.
Isso ficou claro na declaração
pouco entusiástica de Xanana e na conferência
de imprensa que se seguiu, bem como nas palavras de Ramos-Horta
e Sérgio Vieira de Mello, que se congratularam de forma
efusiva com o fim do "tabu" do líder histórico
da resistência, salientando a sua importância
para o serenar dos ânimos da população
e dos partidos. E, em nome de um processo eleitoral pacifico,
Xanana deixou mesmo um "se" no ar: só avança
de facto com a sua candidatura se os partidos "aceitarem
os resultados das eleições", promovendo
nas suas estruturas de base "a política da tolerância
e do respeito mútuo".
Xanana deixou mais uma vez claro que não
era sua intenção ocupar qualquer cargo político
depois da independência e lembrou mais uma vez o juramento
que fez "sobre os tombados" em combate e aos guerrilheiros
de que não reclamaria para si nenhum cargo político.
O facto de ter sido colocado por todos os partidos "numa
situação de total dependência", já
que têm vindo a afirmar há vários meses
que ele "seria o candidato para presidente da República",
foi outro dos factores que o levaram a avançar de imediato.
"Espero assim também pôr termo a todas as
especulações em torno da questão."
Ainda assim, o líder histórico
da resistência, que hoje apenas ocupa o cargo de presidente
do Movimento dos Veteranos da Resistência, diz saber
que não é "a pessoa mais indicada"
para presidente da República, dando a entender que
se sente obrigado pelas circunstâncias políticas
a avançar. "Ultimamente, tenho-me sentido muito
cansado, depois do peso de 25 anos. Sempre alimentei o sonho
de que, depois da independência, teria tempo para cultivar
abóboras e criar animais. E as esperanças nunca
devem morrer."
Uma obrigação que Xanana Gusmão
já há muito tempo tinha percebido que tinha
que assumir. Ramos-Horta, há 15 dias, tinha mesmo afirmado
ter a certeza que Xanana seria candidato à presidência
da República, lembrando ontem que há muito sabia
desta decisão. Ramos-Horta, ainda que inadvertidamente,
acabou mesmo por revelar que o líder histórico
ia avançar com a candidatura, hora e meia antes de
Xanana o fazer, e foi uma das personalidades que mais insistiu
na necessidade de Xanana anunciar já a sua candidatura.
Mas Xanana, segundo garantiram ao PÚBLICO
alguns dirigentes políticos próximos do ex-presidente
do CNRT, teria preferido esperar pela divulgação
dos resultados eleitorais para fazer o anúncio.
O próprio Xanana, em declarações
feitas na véspera, afirmava que ainda não tinha
tomado a decisão, declarando mesmo que esta não
era a melhor altura para o fazer - "creio que não
descansava as pessoas", se revelasse já estar
disponível ou não para se candidatar, disse
numa entrevista ao "Expresso" concedida na quinta-feira,
sublinhando mesmo que isso poderia "dar dores de cabeça
ao povo" em vésperas da eleição
para a constituinte.
O receio de que o processo eleitoral -especialmente
na altura em que forem divulgados os resultados - possa resultar
numa espiral de violência entre os partidos foi fundamental
para convencer Xanana Gusmão a aceitar as pressões
que lhe foram feitas para avançar já.
Isso mesmo fica claro na declaração
que Sérgio Vieira de Mello fez após o anúncio
de Xanana: "Estou extremamente satisfeito. É a
decisão certa e que vai serenar a população.
Que vai dar confiança ao povo e que dissipa o clima
de incerteza e especulação que vinha pairando
sobre o processo eleitoral."
"Vai tranquilizar os ânimos
e ajudar a apaziguar os partidos políticos", afirmou,
por sua vez, Ramos-Horta, que garante já que Xanana
Gusmão vai ter "100 por cento dos votos".
O povo já começou a festejar um pouco por todo
Timor-Leste o novo e desejado candidato a Presidente da futura
república independente, e alguns partidos vieram mesmo
para as ruas de Díli festejar, dando à capital
um ambiente de campanha eleitoral que até agora ainda
não se tinha visto de forma tão clara.
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