Caderno Eleitoral
Erros em Nome da Reconciliação
Por Luciano Alvarez
Quinta-feira, 23 de Agosto de 2001

A uma semana das eleições em Timor-Leste, a UNTAET veio mais uma vez falar em reconciliação. Não o fez de certeza por acaso. Na véspera, um destacado membro das antigas milícias integracionistas, de seu nome Juanico, um dos conhecidos assassinos dos tempos do terror, garantia à imprensa indonésia a partir de Timor Ocidental, onde está refugiado, que estavam a entrar armas de vários países no território e que iria haver nova guerra civil em Timor-Leste.

Talvez por isso, ontem, a UNTAET apresentou aos jornalistas um homem jovem, acompanhado da sua mulher, igualmente jovem, que há uns dias está em Díli em missão de reconciliação. Elio Caetano, assim se chama o homem que aparenta pouco menos de 30 anos, foi em tempos apoiante da independência, mas depois mudou-se para o lado integracionista. Elio diz ser um político. Actualmente ocupa o cargo de porta-voz da UNTAS, o braço político das milicias integracionistas que ainda vivem em Timor Ocidental.

Elio, segundo garantiu, veio a Timor para ver como estavam as coisas, pois assegura que "se tudo correr bem nas eleições" está pronto para fazer regressar ao lado Leste algumas centenas de refugiados que ainda se encontram na metade indonésia da ilha. Perante os jornalistas, Elio assegurou que vinha em nome dos refugiados e não da Untas. Afirmou ser um apoiante da reconciliação, quase jurou estar arrependido de ser um defensor da integração e garantiu estar pronto para respeitar os resultados eleitorais. Só tinha uma condição para tudo isso: que Timor se transformasse "num estado democrático e não socialista e comunista".

Uma garantia que, assegurou, teve da Fretilin, um dos principais partidos concorrentes à eleição do dia 30.

Elio, aliás, apenas sentiu necessidade de se encontrar com a Fretilin para esclarecer as suas dúvidas, ignorando os outros 15 partidos. E a UNTAET organizou a reunião. Por isso, ontem, durante a maior parte da conferência de imprensa Elio falou muito sobre Fretilin e os seus lideres, discursando como se este partido já tivesse ganho as eleições.

É claro que Elio pode pensar que é a Fretilin que vai ganhar as eleições. Quase toda a gente o acha em Timor e alguns lideres políticos com responsabilidades, como Ramos-Horta, já o admitiram publicamente.

Houve, porém, um erro grave em tudo isto. Um erro da UNTAET, entidade independente, que não pode ignorar os outros partidos e promover publicamente uma pessoa, mesmo que as intenções sejam as melhores, que assegura falar em nome de muitas outras centenas de pessoas que, como ele, acham que há um vencedor antecipado das eleições e, por isso, é desse partido que vem obter garantias.

A UNTAET não pode, mesmo em nome da fundamental reconciliação, promover na sua sede actos destes. Chama-se a isto deitar achas para a fogueira.


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