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"A
Culpa É do Estado e dos Governos e Não das Empresas"
Por Henrique Neto
Quinta-feira, 6 de Setembro de 2001
Como aumentar a produtividade? - Um empresário
e três cidadãos respondem à pergunta. O primeiro
defende mudanças na atitude do Estado e dos governos. Os
segundos apontam alterações nas empresas
Todos sabemos que em Portugal o produto por
trabalhador é menos de metade da média da União
Europeia (43%) e que praticamente não se alterou desde a
adesão em 1986 (41%), o que demonstra que sem a resolução
do problema da produtividade não existirá progresso
real na evolução da economia portuguesa, como foi
recentemente demonstrado, se acaso era necessário, num excelente
texto do dr. Manuel Pinho publicado no "Expresso", com
argumentos e dados que não vou aqui repetir. Por isso limitar-me-ei
a demonstrar que a principal culpa da baixa produtividade nacional
é do Estado e dos governos e não das empresas ou dos
empresários, começando com um exemplo prático.
No pequeno grupo empresarial de que faço
parte temos duas empresas a laborar no mesmo sector de actividade,
em que o valor acrescentado por trabalhador (VAB) é muito
diferente de uma para a outra - na primeira é de 7622 contos
e na segunda de 3203 contos. Ambas as empresas iniciaram a sua actividade
há meia dúzia de anos, ambas receberam apoios comunitários,
ambas utilizam equipamentos e tecnologias semelhantes (a segunda
empresa foi adquirida chave na mão na Alemanha); a primeira
foi fundada por nós e a segunda comprada recentemente em
situação de grande degradação, importando
dizer que as despesas com pessoal são semelhantes: 2450 contos
anuais "per capita" na primeira e de 2056 contos na segunda.
Acontece que a segunda empresa sofre, desde
a sua fundação, de erros profundos, erros que não
são relevantes para o tema aqui tratado, mas que resultaram
em grandes prejuízos acumulados, e a empresa sobreviveu todo
este tempo apenas porque há quatro anos deixou de pagar à
segurança social, cessou a apresentação de
contas ao fisco e de pagar impostos, além de que, verdadeiramente,
nunca pagou o investimento inicial - ou seja, esta empresa serve
apenas como exemplo dos milhares e milhares de empresas semelhantes
que sobrevivem em Portugal com baixíssima produtividade,
sem qualquer razão económica útil e malbaratando
o principal recurso nacional, que é o trabalho, além
de contribuírem, pela sua mera existência, para reduzir
de forma muito relevante a produtividade portuguesa.
Como é óbvio, a responsabilidade
principal desta situação é do Estado, não
apenas por falta de execução das dívidas próprias,
mas também porque o mau funcionamento da justiça conduz
o sistema financeiro - que deveria ser o motor da reestruturação
das empresas em dificuldade, que qualquer economia deve realizar
- a conviver com problemas de incumprimento muito para além
do prazo razoável. E se sustento que a culpa não é
dos empresários, é também porque, sendo o Estado
que impede o normal desaparecimento das empresas, é ainda
o mesmo Estado que penaliza os empresários competentes e
produtivos, deixando desenvolver a concorrência desleal e
viciosa das empresas de baixa produtividade. Mas as culpas do Estado
não acabam aqui. Por exemplo, as condições
especulativas, de ilegalidade e de corrupção em que
se desenvolve uma parte importante do sector imobiliário,
têm motivado, ao longo dos anos, a criação e
a manutenção de milhares de pequenos estabelecimentos
comerciais, restaurantes, hotéis e actividades várias,
por vezes resultantes de incentivos públicos, como o Procom,
que ocupam milhares de trabalhadores sem formação
ou qualificação, que são factores de baixa
produtividade e de forte degradação da qualidade geral
do país, nomeadamente no turismo, actividades sem qualquer
futuro para os trabalhadores ou para a economia nacional. Situação
que poderia e deveria ter sido corrigida e orientada por critérios
estratégicos exigentes e por uma rigorosa selectividade nos
diversos apoios gerados pelos fundos da União Europeia.
Por sua vez, o próprio sector da construção
e obras públicas, bem como outros sectores de bens não
transaccionáveis são deixados operar nas margens da
legalidade, nomeadamente com o incentivo da ausência de fiscalização
e o recurso fácil ao trabalho escravo de trabalhadores estrangeiros,
contribuindo para o desenvolvimento de um certo tipo de promiscuidade
económica de Terceiro Mundo que é, naturalmente, prática
e pedagogicamente contrária ao desenvolvimento de um tecido
económico são, inovador e de elevada produtividade.
Finalmente, os serviços fornecidos pelo
próprio Estado, ou dependentes da acção do
Estado, funcionam, como todos sabemos, com baixíssima produtividade,
mas ocupam milhares de trabalhadores sem utilidade visível
e impedem pela via da burocracia e do abuso do poder o normal desenvolvimento
e progresso das empresas competitivas.
Em resumo, é evidente que Portugal não
tem todos os bons empresários e quadros de que necessitaria,
nem o número suficiente de empresas de elevada produtividade,
mas é o Estado que pela sua acção, activa e
passivamente, permite e sustenta a sobrevivência dos maus
empresários e de um tecido económico degradado pelo
exemplo bem sucedido da corrupção e da especulação.
Empresários que não pagam impostos, ainda que alguns
assinem cheques de milhões de contos para comprar jogadores
de futebol, cuja actividade se exerce em estádios pagos e
sustentados com o dinheiro dos contribuintes, na sua maioria trabalhadores
e, suponho, alguns empresários distraídos ou sérios
- ou seja, com este modelo de pedagogia pública ninguém
deve ficar surpreendido com a baixa produtividade nacional.
presidente da Iberomoldes, uma das empresas
que mais conquistas tem feito na batalha da produtividade; foi deputado
do PS, na legislatura passada, mas regressou à indústria
a tempo inteiro.
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