|
Palavra
de cidadão
Sábado, 15 de Setembro
de 2001
João Gil
Músico, Compositor
Como é que se pode sentir um português
"pagante", tal como eu e tantos, num país onde
a evasão fiscal é prática corrente e a expressão
"o Estado é ladrão" passou a escudo moral
para quem, largando o seu Porsche na cara dos funcionários
das finanças (também pagantes) e à vista desarmada,
deixa uma ninharia de impostos tipo "toma lá"?
Meu Deus ao que chegámos. E nós?
Sim, e nós os que pagamos, vale mais o nosso dinheiro? Passamos
à frente em qualquer fila? Falamos mais alto? Nas eleições,
cada voto vale por vinte?
Não sei, se calhar torno-me desta maneira
em "polícia" de bons costumes de cidadão
exemplar.
Os tais que não pagam fazem uma economia
paralela de milhões e milhões, cujo enunciado começa
invariavelmente por "Com factura ou sem?" Pronto, vá
lá, vá lá, todos sabemos que muitos não
pagam, fazem questão de não o fazer, e, mais, vangloriam-se
perante a TV, ganham protagonismo, e, se for preciso, ainda dão
autógrafos na rua, é lindo...
Algo está errado com certeza.
É muito duro para todos e é estranho
o desconforto perante alguém que rouba o Estado com prazer
e orgulho, acreditando que nós (os outros) só não
o fazemos porque não queremos ou sabemos. Fixe!
Proponho solenemente a criação
do dia do pagante, uma festarola com juros acrescidos de alcoolemia
para esquecer e orgulho para lembrar.
Um abraço deste que tanto vos quer.
Paulo Forte
autor, produtor e realizador de vídeo
Quem paga impostos é tanso. Quem tem ética não
come. Porque é que irei pagar impostos, se o Estado não
é "boa pessoa"? São frases muito ditas nos
últimos tempos.
Em primeiro lugar, a questão e a solução
equacionam-se ao nível pessoal, de cada um com a sua consciência.
Por muito estranho que isto pareça, eu acredito que, quando
existir um número suficiente de pessoas que paguem os impostos,
então tornar-se-á inevitável a eficácia
da exigência da boa condução e gestão
dos dinheiros públicos, que, nunca é de mais recordar,
são de todos, embora, como é sabido, nem todos os
paguem, o que remete para o segundo lugar da questão.
Como é que o Estado, os governos e os
partidos organizam a coisa para resolver os problemas, reformar,
fiscalizar, em suma, garantir justiça fiscal a cada um de
nós e aumentar as receitas num país que possui nas
suas contas um défice que se eterniza, não esquecendo
que mais receitas serão factores de desenvolvimento individual
e colectivo? Pois parece que quem tem responsabilidades governativas
não governa. As reformas andam para trás ou não
andam mesmo, como o disseram os trabalhadores fiscais, ao lembrar
que faltam os computadores e a formação adequada para
dar cumprimento à "nova" reforma.
Assim, se em primeiro lugar a questão
tem que ser resolvida na consciência de cada um, ajudaria
muito que o Estado incentivasse à boa opção.
Um exemplo: quando o Estado deve mais a um cidadão que o
cidadão ao Estado, porque é obrigatório que
o cidadão pague na hora e, se se atrasar, com juros de mora?
Nunca recebi juros de mora do Estado. Parece-me necessário
criar um só peso e uma só medida, traduzido em medidas
práticas que ponham num mesmo plano o cidadão e o
Estado. Quando, por exemplo, um clube de futebol não paga
o imposto devido, porque é que a RTP, cujo accionista é
o Estado, lhe paga cerca de 50 mil contos em direitos de emissão
por jogo?
Cidadãos, uni-vos no clube dos tansos.
Quando o clube não pagar, dividimos a dívida e os
juros de mora por cada um, a ver quanto é que cada um tem
a haver e, então, cada um vai buscar uma cadeira à
bancada. Parece-vos bem? A asneira do outro não autoriza
nem justifica a minha. No cemitério, o dinheiro não
se usa.
|
|
|