Qualidade do Ensino Desilude
Quando Comparada com
Os Investimentos Feitos na Educação
Por Alexandra Sanchez
Sábado, 22 de Setembro de 2001
Entre 1990 e 2000, o orçamento destinado
ao sector triplicou. Mas os níveis de insucesso, sobretudo
nalgumas disciplinas, continuam a incomodar a comunidade educativa
Os dados mais recentes (1998) dizem que
quatro em cada dez alunos portugueses matriculados no secundário
não conseguem obter o diploma, um cenário já
ultrapassado por todos os outros países da OCDE, onde
as taxas de conclusão deste nível de estudos
são superiores a 70 por cento. Indicadores como estes
são inevitáveis sempre que o tema "qualidade
do ensino e das aprendizagens" vem à baila.
É que o país que é
elogiado frequentemente por, nos últimos anos, ter
feito um enorme esforço ao nível do investimento
na educação - em Portugal as verbas destinadas
ao sector quase triplicaram entre 1990 e 2000 - acaba por
ficar sempre muito mal cotado nas comparações
internacionais que dão conta dos frutos desse investimento.
Recentemente, um relatório da OCDE dava o exemplo da
República Checa, ou da Holanda (onde os gastos com
cada aluno se assemelham aos portugueses) para dizer, basicamente,
que o dinheiro não é tudo. Nem é sinónimo
de bons resultados escolares. Os jovens checos do ensino básico,
por exemplo, ocupam os lugares de topo nos testes de aferição
internacional de competências em Matemática e
Ciências. Portugal está nos últimos lugares
da lista.
É incontestável que o país
investiu muitíssimo na educação (em grande
parte à custa de programas comunitários), depois
de um longo período em que a negligenciou, ficando
a marcar passo em relação ao resto da Europa.
Apesar de ainda existirem escolas em pré-fabricados
- resquícios de um passado recente marcado pela explosão
do número dos que começaram a aceder às
escolas - e outras onde se passa frio no Inverno, todos os
anos são construídos ou reconstruídos
novos estabelecimentos de ensino e reforçado o equipamento.
Hoje, cada aluno do básico e secundário implica,
segundo a OCDE, um investimento público superior em
40 por cento ao do início dos anos 90. "Enquanto
a despesa dispara, há persistentes dificuldades em
melhorar a qualidade, os mecanismos de rigor e exigência
são pouco valorizados e não há programas
de combate ao desperdício, que começa em cada
escola", afirma Joaquim Azevedo, ex-secretário
de Estado do Ensino Básico e Secundário, num
livro reeditado este ano ("Avenidas de Liberdade"
- Edições Asa).
Dificuldades começam nos primeiros
anos
E, no entanto, a hora de ver as notas
nas pautas continua a ser uma dor de cabeça para a
comunidade educativa. A recente introdução de
provas de aferição nacionais no 4º ano
do ensino básico revelou o que já se adivinhava:
que muitas dificuldades começam nos primeiros anos
de escola. Quer na Matemática, quer no Português,
as médias nacionais foram positivas, mas não
propriamente satisfatórias. Questões que implicam
mais raciocínio e capacidade de abstracção
revelaram ser verdadeiras ratoeiras para os miúdos.
Mas não só: os resultados
dos últimos exames nacionais do secundário mostram
que 70 por cento dos jovens que frequentam o 12º ano
chumbaram no exame de Matemática. Apenas 51 escolas
conseguiram uma média neste exame acima do dez e praticamente
todas elas ficam no litoral. Aliás, a este respeito,
disse recentemente Valadares Tavares, antigo presidente do
Comité de Educação da OCDE: o país
tem níveis de assimetria regional "superiores
àqueles que países como a França tinham
nos anos 70".
O ensino superior, o sector onde o crescimento
nas últimas duas décadas foi mais explosivo
(168 por cento entre 1990 e 1996 - dados da OCDE) não
sai incólume e sofre as consequências daquilo
que muitos apontam como "má preparação
dos jovens": as taxas de insucesso são muito elevadas,
cerca de metade dos alunos acabam por desistir dos cursos
e em média um diploma leva nove anos a obter.
Todos estes factores levam muitos a falar
de desperdício, má gestão, falta de avaliação
dos investimentos feitos. Recentemente, o ministro da Educação,
Júlio Pedrosa, admitia que com os actuais recursos
é, de facto, "possível fazer mais e melhor".
Como? Com uma "reforma" em
curso, que revê programas dos ensino básico e
secundário, com a atribuição à
escola de matérias como educação sexual
e cidadania e com a introdução de conceitos
como "flexibilidade dos currículos", que
permitirá que o currículo nacional possa ser
adaptado à realidade de cada turma. Pretende assim
o Governo colmatar aqueles que são, há muito,
apontados como os maiores entraves ao sucesso dos alunos:
a extensão e o enciclopedismo dos programas, pensados
para a elite que frequentava os antigos liceus; a desmotivação
do corpo docente; os métodos de ensino que privilegiam
excessivamente as aulas expositivas; as grandes carências
ao nível do ensino experimental.
Também a avaliação
começa a entrar no vocabulário dos governantes.
Depois de, há quatro anos, ter arrancado um longo e
conturbado processo de avaliação das universidades,
também no não superior teve início, no
ano passado, um projecto de "avaliação
integrada" em cerca de 300 escolas. Pretende a Inspecção-Geral
da Educação apreciar desde os modelos de gestão
dos estabelecimentos de ensino até à forma como
os professores lidam com os seus alunos e ultrapassam dificuldades
relativas, por exemplo, à origem social e cultural
dos miúdos. Uma avaliação para alargar,
a médio prazo, a todos os estabelecimentos não
superiores.
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