"Pau i el seu germà", de Marc Recha
e "Distance" de Hirokazu Kore-eda
A vida, depois da morte
Do nosso enviado Vasco Câmara,
em Cannes
Quinta-feira, 10 de Maio de 2001
Que fazer com a morte?
A pergunta foi feita na competição por dois filmes, "Pau i
el seu germà"/ "Pau e o seu irmão", do catalão Marc Recha,
e "Distance", do japonês Hirokazu Kore-eda. É a terceira longa-metragem
dos dois cineastas, ambos já com algum prestígio conquistado
em festivais.
O primeiro
surge mais desprotegido, mas o segundo vem integrado numa
frente da "nova vaga" japonesa de que se fala. Pode
ainda acrescentar-se: são filmes em que as personagens
são obrigadas a lidar com um trauma, com a perda, mas
nesse percurso, um quotidiano de auto-reconhecimento, o catalão
olha para a terra, o japonês para o céu.
Em "Pau i el seu germà", a morte de um irmão
leva um filho e uma mãe a deslocarem-se até
uma aldeia dos Pirinéus onde ele vivia. A câmara
de Marc Recha espreita o silêncio, mas um silêncio
visceral, que acompaha a recomposição dos laços
deixados por quem morreu e a formação de novos,
por quem sobreviveu. É um filme sobre a energia da
natureza e a energia dos corpos que se cruzam.
Em "Distance", um grupo de pessoas encontra-se todos
os anos para uma viagem: deslocarem-se ao local onde familiares
que faziam parte de uma seita religiosa se suicidaram depois
de terem organizado um massacre. A "distância"
de que fala o título, é aquela que permanecerá
sempre com as personagens: a que separa os que julgam ter
o absoluto (os que morreram acreditando numa Verdade) e os
que ficaram com as dúvidas e com as contradições
(os que estão vivos). Como diz o realizador: "Somos
todos familares de criminosos mortos". É um filme
sobre a memória e sobre o luto.
O quie junta ainda "Pau i el seu germà" e
"Distance" é o facto de serem filmes frágeis,
quase voláteis, facilmente eclipsáveis no turbilhão
que é o Festival de Cannes.
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