«Vou para Casa», de Oliveira, e «Ganhar
a Vida», de Canijo
Sasportes vai a Cannes ver
filmes portugueses
Marta Fernandes
12 de Maio de 2001
O ministro da Cultura português, José Sasportes,
vai assistir amanhã à apresentação do filme "Vou para Casa",
de Manoel de Oliveira, que integra a selecção oficial do Festival
Internacional de Cinema de Cannes e concorre para a Palma
de Ouro. Sasportes ficará em Cannes até segunda-feira para
assistir ainda à projecção da segunda presença portuguesa
no festival francês - o filme "Ganhar a Vida", de João Canijo,
que será apresentado na secção Un Certain Regard.
O mestre do cinema português, Manoel de Oliveira,
regressa a Cannes, dois anos depois de ter recebido o Prémio
do Júri, com o filme "A Carta". "Vou para Casa", com estreia
prevista em Portugal para meados deste ano, inspira-se em
duas peças de teatro - "O Rei está a Morrer", de Eugène Ionesco,
e "A Tempestade", de William Shakespeare - e no romance "Ulisses",
de James Joyce.
O filme de Oliveira conta com as interpretações
de Michel Piccoli, John Malkovich (que trabalhou com o cineasta
em "O Convento") e Leonor Silveira, uma presença habitual
na filmografia do realizador de 92 anos. "Vou para Casa" é
a história de um actor de teatro, Gilbert Valence, interpretado
por Piccoli, que redobra assim a sua presença em Cannes, uma
vez que o seu filme "A Praia Negra" (a sua segunda incursão
pela realização) foi anteontem apresentado na Semana da Crítica,
tendo colhido o aplauso do público e dos críticos, que não
pouparam elogios.
"Ganhar a Vida", recentemente estreado em
Portugal, integra também a selecção oficial do festival, na
categoria "Un Certain Regard". A longa-metragem de Canijo
decorre no meio da comunidade portuguesa em França, que vive
na "banlieue" parisiense, em bairros incaracterísticos semelhantes
aos que se observam em "O Ódio", de Mathieu Kassovitz (já
exibido em Portugal).
Cidália, interpretada por Rita Blanco (que
volta assim a trabalhar com João Canijo, com quem iniciou
o seu percurso de actriz, há 15 anos), tem 36 anos, é portuguesa
e vive com o marido, a irmã e os dois filhos. A vida de Cidália,
tal como a de tantas outras portuguesas radicadas em França,
resume-se ao árduo trabalho nas limpezas, à poupança de todos
os tostões, guardados religiosamente para construir a casa,
quando um dia, que não se sabe quando e parece sempre que
nunca chega, voltar a Portugal.
Mas, numa madrugada fria, Cidália recebe um
telefonema no trabalho. Não se ouve a voz, não se sabe o que
se passou, mas ela sai disparada. O filho mais velho, a quem
ela pedira para regressar a casa cedo, morreu, alegadamente
assassinado pela polícia. A partir daí, a vida de Cidália
transforma-se. Inconformada com as explicações oficiais e
com a passividade da comunidade e da sua própria família,
Cidália revolta-se e quebra a lei do silêncio em que se escondem
os "tugas", com medo de represálias e xenofobias. Ao revoltar-se
contra tudo e todos, num caminho de expiação da morte do seu
filho, Cidália vai ganhar verdadeiramente a vida, na redenção
da água do Sena e da chuva parisiense.
Rita Blanco tem em Cidália, provavelmente,
um dos melhores papéis de toda a sua carreira e o filme está
rodeado de expectativa, pois apesar de não concorrer à Palma
de Ouro, é uma imagem perturbadora da comunidade portuguesa
em França e da sua relação com o país que a acolheu.
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