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  Nanni Moretti é, segundo as bolsas de apostas, o virtual vencedor da Palma de Ouro com o filme "O Quarto do Filho"
 
   

Palmarés é anunciado amanhã
Cherchez la Palme ou Nanni Moretti já tem a
Palma do Coração
Do nosso enviado Vasco Câmara, em Cannes
Sábado, 19 de Maio de 2001


Nanni Moretti é o virtual vencedor da Palma de Ouro, dizem as bolsas de apostas. O que fazer a "La Pianiste", de Haneke, ou a "Va Savoir", de Rivette? Isabelle Hupper e Michel Piccoli (no filme de Oliveira) serão os intérpretes que Cannes vai destacar.

Nas bolsas festivaleiras que fazem o "cherchez la Palme", "O Quarto do Filho", de Nanni Moretti será a Palma de Ouro da 54ª edição de Cannes. Da mesma forma que, há dois anos, a Palma de Ouro era "Tudo sobre a minha mãe", de Pedro Almodóvar... que, afinal, não foi.

Não ganhou, mas não interessa: o espanhol, nessa edição, como o italiano, este ano, apoderaram-se daquilo a que um cronista chamou a Palma do Coração. Isto quer dizer, numa interpretação cínica: ambos fizeram filmes em que tanto os espectadores como a crítica choraram.

Isto quer dizer, numa versão mais calorosa, que "O Quarto do Filho" conseguiu ser o ponto de encontro das projecções e fantasmas emocionais dos festivaleiros, mesmo daqueles que não consideram este o melhor filme de Nanni Moretti e preferem o Moretti mais fragmentário e narcisista de "Querido Diário". Mas, como o realizador/actor com orgulho repetiu, citando alguém que tinha visto "O Quarto do Filho", "isto é mais do que um filme, isto é uma verdade emocional".

É por isso que "La Pianiste", de Michael Haneke, vai ser preterido? Não houve, aliás, objecto mais simbólico de um desencontro do que este, ao provocar reacções de adesão apaixonada e da mais visceral recusa. Mas isso respira também uma "verdade", emocional, e essa divisão não deixa de ter um valor espectacular, de acontecimento. Será que o filme da pianista masoquista interpretada por Isabelle Huppert vai fazer figura de terrorista, como o proletário "Rosetta", e roubar a Palma?

Na batalha entre um filme "doce", como o de Moretti, e um filme "amargo", como o de Haneke, e nos jogos que vai ter de jogar o júri presidido pela actriz e realizadora Liv Ullmann, que papel estará reservado para a belíssima extravagância de Jacques Rivette, "Va Savoir"? Há quem se dedique a investigar qual destes filmes é mais "bergmaniano"; a adivinhar em qual deles é que a presidente Liv se poderia reconhecer. O problema é que, por aí, até podiam ser os três...

Numa "segunda linha", à espera de integrarem o palmarés, estão muitas das boas obras que por aqui passaram: "Je Rentre à la Maison", de Oliveira (decididamente, um filme também de encontro emocional, chegando a espectadores que estão habitualmente ausentes da obra do português); "Mulholland Drive", de David Lynch, que desnorteou as percepções no momento da sua exibição mas que agora começa a "crescer", ou os asiáticos "Et Là-bas quelle heure est-il?", de Tsai Ming-liang, "Millenium Mambo", de Hou Hsiao-Hsien e "De l'Eau Tiède sous un Pont Rouge", de Shohei Imamura.

O "agradecimento" aos americanos pela presença na competição valerá um prémio a "Shrek", ainda por cima um - muito divertido - filme de animação, ou uma satisfação aos irmãos Coen, apesar da aridez de "The man who wasn't there?".

E o que fazer à militância e ao humanismo de "Kandahar", de Mohsen Makhmalbaf ou ao golpe de teatro revisionista (e a gritar arte por todos os lados) que é o retrato dos últimos dias de Lenine em "Taurus", de Alexandre Sokurov? O "duelo" entre os actores espelha o que se passa entre os filmes. À frente, Isabelle Huppert, monstruosa de génio em "La Pianiste", e Michel Piccoli, sedutor e cheio de sortilégio no filme de Oliveira. À espreita estão Jeanne Balibar, ("Va Savoir") e Léonid Mozgovoi ("Taurus").

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