Colecção
Privada
Lempicka, que pintou vários auto-retratos, preferiu sempre representar corpos de mulheres - a maioria, nus. "Retrato de Madame M." é, por isso, uma "obra singular", diz Carlos Carvalheiro, director artístico do grupo de teatro Fatias de Cá, de Tomar, que é um admirador e está agora a encenar uma peça sobre a pintora. "Esta pintura é um contraponto à própria obra da pintora. Aqui, não temos mais uma pintura de alcova, exibicionista. O que sobressai é uma vontade de afirmar o 'glamour' da feminilidade." O erotismo do "Retrato de Madame M." (figura enigmática e desconhecida) é, por isso, de "uma outra natureza, diferente dos muitos nus explícitos que Lempicka pintou". Ou seja, de uma sensualidade mais "doce", que se debate contra "a funcionalidade dos homens". A relação "homem-mulher" é, aliás, um tema que "percorre toda a obra da artista". São conhecidos os seus inúmeros e conturbados romances, entre outros, com o poeta e novelista italiano Gabriel d'Annunzio. A correspondência trocada entre ambos transparece uma relação conflituosa, perturbada. Uma espécie de jogo de forças, entre a paixão e o ódio. Lempicka confidencia-lhe a certa altura: "Estou convicta de que é o único que compreende tudo e que mesmo assim não me julga louca." A peça que Carlos Carvalheiro está a encenar, "Tamara", estreou em Toronto pela companhia Necessary Angel e foi escrita em 1981 pelo dramaturgo canadiano John Krizanc - e é precisamente sobre a relação entre Lempicka e D'Annunzio. "Na verdade, o meu quadro preferido de Lempicka seria aquele que ela nunca chegou a pintar, quando, em 1927, visitou Gabriel d'Annunzio na sua casa." D'Annunzio era considerado por Lenine como o "único italiano genuinamente revolucionário", mas o poeta era também um sedutor, um predador, que convidou Tamara a pintar-lhe um retrato, apenas com a "intenção de a seduzir". Já a pintora, acredita o encenador, apenas queria "ganhar fama com o retrato". A pintora, que nasceu na Polónia e desembarcou em Paris em 1923
fugindo à revolução na Rússia, teve como mentor
o pintor e escultor cubista francês André Lhote. Sobre si,
Lempicka escreveu à filha: "Fui a primeira mulher a pintar
com limpeza e foi essa a base do meu êxito. Os meus quadros destacar-se-ão
sempre das restantes obras. Foi assim que os galeristas começaram
a pendurar as minhas pinturas nas melhores salas, sempre ao centro. A
minha pintura era atraente, concisa."
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