"Casamento Debaixo de Chuva", de
Mira Nair
Por ISABEL SALEMA
Mira Nair,
a realizadora "moderna" indiana, mergulhou no
universo de Bollywood, e saiu de lá com um filme
"made in India" para ser consumido no Ocidente.
O sucesso de "Casamento Debaixo de Chuva" foi
tão grande que o Verão de 2002, quando o filme
estreou, poderia ser descrito nas crónicas como "um
verão indiano". "Casamento Debaixo de Chuva"
foi o mais rentável filme indiano estreado nos EUA.
O filme de Mira
Nair, uma indiana radicada nos EUA, ganhou o Leão
de Ouro de Veneza em 2001. Na altura, um crítico
escreveu que era "um filme com um sorriso nos lábios",
acrescentando que o segredo do êxito foi ter transformado
uma cultura e uma sociedade estranhas, a indiana, em "entertainment"
para consumo ocidental, "um exotismo com chuva, canções
e caril".
O filme é
sobre um casamento combinado entre os pais dos noivos, à
moda antiga. Os noivos são uma jovem de Nova Deli
e um informático indiano que vive no Texas. Os dois,
como manda a tradição, nunca se viram antes
da cerimónia.
A família
alargada, que tem a sua origem no Punjab, começa
a convergir para a cerimónia em Deli e é na
gestão do percurso das 60 personagens que Mira Nair
organiza o filme, num desdobramento narrativo em vários
sub-enredos que é característico do cinema
indiano. Mas há quem fale também na influência
de Robert Altman, um versão Punjabi dos filmes do
realizador norte-americano. Acompanhamos os últimos
preparativos do casamento e o nervoso do pai da noiva, Lalit.
Mistura-se classe média-alta com criadagem e fornecedores.
A realizadora,
que aprendeu a contar histórias em Hollywood, entra
nas casas da burguesia da capital, mostra os bastidores
de um "talk-show" televisivo intitulado "Dehli.com"
onde se discute a liberalização dos costumes
e se assiste à dobragem de uma cena "hardcore",
ouve as mulheres do clã de revista "Cosmopolitan"
na mão (a sexualidade feminina é um tabu no
cinema indiano), faz emergir o tema da pedofilia (outro
tabu). Vimos um mundo global que é o espelho do exotismo
do casamento combinado, introduzindo o cheiro de comédia
nesse desconcerto. Mira Nair diz que o seu filme é
sobre a Índia moderna.
No final,
todos se abrigam debaixo da tenda, na celebração
de dois casamentos - o dos subalternos também - que
a chuva abençoa. As canções, que remetem
para um musical de Bollywood, entram também na celebração.