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SerieY 3
"Uma História Simples"
 

"Uma História Simples",
de David Lynch
Vasco T. Menezes

 

Na pequena cidade de Laurens, no Iowa, Alvin Straight (Richard Farnsworth), um velhote de 73 anos, vive com a filha, Rose (Sissy Spacek). Durante uma noite de tempestade, chega a notícia de que Lyle (Harry Dean Stanton), o irmão de Alvin, sofreu um enfarte. Apesar de já não se falarem há dez anos, o ancião decide visitá-lo, em busca de uma reconciliação.


O problema é que Lyle vive no Wisconsin, em Mount Zion, a 500 quilómetros de distância, e a fraca visão de Alvin não lhe permite guiar um carro. Aliás, mal consegue andar: fruto de problemas nas ancas, é obrigado a deslocar-se com a ajuda de duas bengalas. No entanto, Alvin mantém-se irredutível e, consciente de que o fim está próximo, resolve levar em frente a sua decisão.


A solução encontrada não podia ser mais insólita: um velho cortador de relva, com um atrelado acoplado, é o veículo escolhido. Mas, depois de iniciada, a viagem termina logo de seguida, porque o motor do "veículo" já não é o que era. Forçado a regressar prematuramente a casa, Alvin não desiste e compra outro cortador de relva...


Não obstante a opinião contrária dos vizinhos e da filha - uma mulher com uma deficiência na fala e torturada pela perda dos filhos, retirados pelo Estado, que, após um acidente, a considerou incapaz de os educar -, Alvin retoma a sua marcha. Um longo e lento percurso, que o levará a atravessar o coração da América e a cruzar-se com inúmeras pessoas.


"Uma História Simples" (1999) é o terceiro filme de David Lynch, um dos mais importantes cineastas contemporâneos, a surgir na série Y. Mas ao contrário de "Estrada Perdida" (1996) ou "Mulholland Drive" (2001), mergulhos abstractos no inconsciente, aqui a bizarria ficou de fora.


Em vez da vertigem onírica, dos "puzzles" surreais ou das narrativas tortuosas, o realizador oferece-nos uma história (como o próprio título indica) bastante linear. E, acima de tudo, pungente, pois "Uma História Simples" é não só uma belíssima meditação sobre a família, como um dos melhores exemplos de celebração lírica da América e das suas gentes.


A partir de uma epopeia verídica, Lynch constrói a sua obra mais acessível e gentil, considerada o melhor filme não europeu nos Prémios do Cinema Europeu em Berlim e dominada pela extraordinária presença de Farnsworth. O veterano, que começou a carreira como duplo, na época de ouro de Hollywood, tem aqui, pouco antes da morte, o papel da sua vida, pelo qual recebeu vários prémios e foi nomeado para o Globo de Ouro e para o Óscar de melhor actor.