As Terças com Morrie. Existe uma capacidade maravilhosa e ao mesmo tempo fundamental que de certa forma permitiu a humanidade crescer e chegar até onde chegou. Essa capacidade, está de tal maneira presente nas nossas vidas que por vezes esquecemos de lhe dar valor, fez, há dezenas de milhares de anos a diferença da nossa espécie, em relação às outras. Trata-se da capacidade de aprendermos uns com os outros. Tal foi uma das condições de fortalecimento dos laços gregários que permitiram a nossa sobrevivência enquanto espécie, por um lado, e por outro, foi condição dessa mesma sobrevivência. A educação, a aprendizagem, a cultura, são faces da mesma moeda desse mecanismo de sobrevivência natural onde o indivíduo, para que a espécie perdure, tem a capacidade de transmitir às gerações seguintes as estratégias e conhecimento que permitem sobreviver, viver melhor e evoluir para além do adquirido. Mas há um aspecto curioso em todo este processo. Para que a substância dessa aprendizagem se renove e se adapte às novas circunstâncias impostas pelo meio, é preciso romper e frustrar o já aprendido. Tudo isto tem como sentido único vencer a morte. Aceitar a morte. É de morte, ou melhor,
da aceitação da morte, como facto fundamental da vida, que
fala As Terças com Morrie. É um livro tocante, comovente,
que conta a história real do reencontro entre um velho professor
universitário que enfrenta uma doença terminal e um ex-aluno,
que ao longo de uma série de semanas o vai visitar todas as terças
para uma última tese final. A tese é sobre a vida, as experiências
nela vividas, e como extrair daí lições. O professor
chama-se Morrie Schwartz, foi professor de Sociologia e Psicologia Social
em várias universidades americanas, sobretudo na universidade de
Brandeis e deixou obra publicada acerca da introdução da
sociologia nos hospitais e nos estabelecimentos psiquiátricos,
prática de que foi pioneiro nos anos quarenta e cinquenta. O aluno
é Mitch Albom, jornalista e cronista desportivo, radialista na
WJR-AM de Detroit, uma rádio americana de grande cobertura, comentador
televisivo, que se licenciou em sociologia com uma tese sobre sociologia
do desporto orientada por Morrie Schwartz. Uma lição de vida. É
pela cativante personalidade de Morrie, que vamos sendo seduzidos ao longo
das páginas deste livro e aprendendo com o seu exemplo. Pelo meio
alguns flash-backs vão dando conta de vários momentos da
vida do mestre, desde a sua infância aos anos de ensino, até
à descoberta da doença e da sua evolução até
à fase terminal em que os encontros têm lugar. Há
várias lições de vida neste livro. Uma delas é
a de aceitar a morte como condição para se aprender a viver.
Amor e morte (Eros e Tanatos) são os grandes impulsionadores culturais
e civilizacionais, Freud disse-o, outros antes dele disseram-no (Sócrates),
e este livro não se cansa de repeti-lo. De certa forma a morte
é esquecida da vida. Cultural e socialmente criou-se todo um conjunto
de mecanismos que nos desviam da sua percepção. Ninguém
acredita na sua própria morte e isso é a condição
para uma entrega sem precedentes a actos mortificantes e mortíferos
de que fazem parte os comportamentos de risco, os descuidados com a saúde,
o consumo, a alienação pelo trabalho ou a busca desenfreada
de entretenimento. Comportamentos que evitam pensar que a morte está
lá um dia, como um dia esteve o nascimento, mas onde a morte perpassa
em filigrana, uma vez que são estratégias de esvaziamento
da vida. Esta alienação, que de uma forma ou de outra todos
sofremos, ganha ainda maior peso se por outro lado as pulsões de
vida (o Amor) também surgirem descentradas, seja pela impossibilidade
de amar o outro, pela incapacidade de envolvimento, pela indisponibilidade.
Este desequilíbrio entre o Amor e a Morte, leva a um desvio de
valores que impõem a transformação dos valores de
vida (amor, amizade, conhecimento...) em valores simbólicos e materiais
(de morte) como o poder, dinheiro, o culto da eterna juventude. De tudo
isto fala Morrie. Texto Miguel C. Martins
SOBRE O AUTOR Mitch Albom nasceu em 1958 em New Jersey. Licenciou-se em Sociologia na universidade de Brandeis onde teve como professor Morrie Schwartz. Tentou inicialmente uma carreira como músico e pianista em Nova Iorque. Desiludido com o meio musical, tira uma pós-graduação em Jornalismo na universidade de Columbia e torna-se repórter e comentador desportivo no Detroit Free Press. Assinou artigos para a AP (Associated Press, agência noticiosa americana), para as revistas GQ, Sports Ilustrated, TV Guide, e GEO Magazine. Colaborou também nos jornais New York Times e USA Today. Actualmente é comentador desportivo regular em diversas cadeias televisivas como a ABC, NBC, CBS e ESPN. Mantém um programa de rádio nocturno na WRJ-AM, uma estação de cobertura nacional. Autor de vários livros, entre os quais quatro de crónicas publicadas no Detroit Free Press, uma biografia do jogador de futebol americano Bo Schembechler. As Terças com Morrie foi o seu maior sucesso tendo figurado na lista de best-sellers do New York Times Review of Books durante quatro anos consecutivos.
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