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"O Cheiro da Noite", de Andrea Camilleri
Já passou dos
70 anos e só começou a publicar romances
tardiamente. Andrea Camilleri, o velho sábio siciliano,
tornou-se um fenómeno literário e de popularidade
com os seus romances policiais que giram à volta
do comissário Montalbano
Por Eduardo Dãmaso
Não há nada
mais óbvio
do que escrever bons romances policiais no país da
mafia e que mais simboliza a gestão implacável
de tudo o que é razão de Estado na segunda
metade do século XX. O "giallo" , nome que se popularizou
na linguagem literária italiana com a famosa série
de romances policiais de capa amarela da Mondadori, tem conhecido
nos últimos anos uma fase de verdadeira explosão
de livros e autores, de que Andrea Camilleri é o verdadeiro
chefe de fila.
Tudo começou com se fosse um segredo de velhos cúmplices. Os leitores de Camilleri foram passando a mensagem boca a boca, dando conta da descoberta de um "novo" autor siciliano. Aos poucos a mensagem foi passando até que as pequenas edições dos primeiros livros foram vertiginosamente ultrapassadas e Camilleri se transformou num verdadeiro fenómeno de popularidade e vendas em toda a Europa. Transformou-se mesmo num dos principais rostos da moderna literatura italiana, ao lado de Antonio Tabucchi, Erri de Luca e Umberto Eco, entre outros.
Deste autor publica amanhã a Colecção Mil Folhas o título "Cheiro da Noite", um dos melhores livros da série construída à volta do detective Savio Montalbano, um personagem que homenageia Manuel Vásquez Montalbán, escritor catalão recentemente falecido. Neste romance, Camilleri volta a explorar alguns dos temas que lhe são habituais: a "omertá", o tráfico de influências, os sinais de uma sociedade onde a realidade raramente é aquela que está à frente dos olhos.
Para todos os efeitos, Andrea Camilleri é um escritor siciliano que carrega o peso de uma herança literária muito rica. A sua obra renova a tradição racionalista de uma escrita que persegue, sob a capa de um localismo obsessivo, as manifestações sociais, económicas e políticas daquilo a que Sciascia chamou "a sicialinização do mundo".
Numa história de personagens vulgares, Camilleri constrói em "Cheiro da Noite" um romance sobre o amor, a solidão, as regras implacáveis da delinquência que gravita à volta de um comportamento de tipo mafioso. Não necessariamente a mafia...
Como sempre, a história está situada em Vigàta, a cidade imaginária onde o comissário Montalbano dita as regras, nunca pela força mas sempre pela inteligência. Desta vez chegou um Inverno rigoroso que deixa Montalbano de mau humor e o seu braço direito, o impagável Mimì Augello, cede finalmente à ideia do casamento. Depois há o inevitável cadáver, que tarda em aparecer, um inquérito que formalmente não é dirigido por Savio Montalbano, um burlão e povo enganado, as especulações sobre a mão invisível da Mafia, enfim, todos os ingredientes de um caso surpreendente e de uma invulgar história de amor.
Em Portugal estão editados oito títulos
de Andrea Camilleri, todos eles da série com o comissário
Montalbano, pela Presença e Difel.
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