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Rafael
Uma viagem ao interior
do exílio
Depois de ter tido o seu nome ligado às lutas académicas
de Coimbra, em 1961 Manuel Alegre foi mobilizado para Angola,
onde viria a dirigir uma tentativa de revolta militar contra
a guerra colonial. Um pouco dessa experiência relatou-a
em “Jornada de África” (1989). Depois, em 1964, quando
regressou a Portugal, fugiu e partiu para o exílio
em Argel. Tornou-se militante da Frente Patriótica
de Libertação Nacional e assumiu o lugar de
um dos locutores da Rádio Voz Liberdade. “Rafael” – o
livro que tem edição prevista para o início
de 2004 – tem por base essa experiência limite. Alegre
avisa, porém: “É muito difícil escrever
o exílio.”
PÚBLICO – O que é que está a
escrever agora?
MANUEL ALEGRE – Tenho outro romance,
que já entreguei,
para sair em Fevereiro ou Março.
Já tem título?
“Rafael”.
Qual é a história? É mais
um ajuste de conta com um fragmento da sua vida?
Não é tanto
um ajuste de contas. É talvez
mais, de novo, o eu-próprio-o-outro. É a história
do exílio, fundamentalmente. Ainda passa por Coimbra,
vai à guerra, é uma espécie de ida ao
interior do exílio. Mas é muito difícil
escrever o exílio. Vejo o exílio como o Holderlin
o via – como a ausência da casa do ser, a sensação
de se ser estrangeiro no mundo, que é a origem de
toda a literatura. Na prosa, essas coisas todas se misturam.
Uma pessoa que é poeta, que tem essa sensibilidade,
e que, de repente, se vê forçado a cortar com
tudo. Ir lá para fora – ficar sem a Pátria,
sem os seus, sem as coisas de que gosta, sem o sol, sem o
mar..., tendo já essa sensação de exílio
cá dentro, antes de partir... Houve capítulos
que me deram muito prazer físico e estético,
outros que foram mais dolorosos. Têm a ver com as viagens
que fazemos pela memória.
C.C.L. |