|
|
"Os Insolentes",
de Marguerite Duras, Amanhã na Colecção
Mil Folhas
Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA
Não se pode deixar
de assinalar a coincidência: o centésimo livro
da Colecção Mil Folhas, aquele que encerra a
3ª e última série, é o primeiro
romance de Marguerite Duras (1914-1996), "Os Insolentes"
(Les Impudents", no original). Depois da publicação
de "Olhos Azuis, Cabelos Pretos" (nº 18, da
1ª série), a escritora regressa ao encontro dos
leitores/coleccionadores com um romance editado em Paris (Edições
Plon) durante a ocupação nazi, em 1943.
Marguerite Duras tinha então 28 anos,
preparava-se para militar na Resistência francesa e
havia já feito a sua iniciação no meio
intelectual parisiense. À data da sua publicação,
o livro não despertou muita atenção,
mas a crítica ficou alertada para o trabalho da jovem
escritora. Os pressentimentos, benéficos, de alguns
dos seus amigos e leitores confirmaram-se um ano depois, em
1944, quando o escritor Raymond Queneau, impressionado com
a singularidade daquela escrita, insistiu com a Gallimard
para que a conceituada editora publicasse "A Vida Tranquila",
o segundo romance de Duras.
Ler "Os Insolentes" pode ser isto:
uma espécie de reencontro de velhos amigos (reconhecem-se
personagens que povoam muitos dos seus livros), mas também
a compreensão do percurso literário de Duras,
assinalado por alguns desvios estilísticos. Aqui se
descortinam muitos fragmentos da bibliografia de Marguerite
Duras: relações intra-familiares pautadas por
uma mescla de amor/ódio, personagens solitárias
que tentam escapar ao sofrimento (através do amor,
da crueldade, dos vícios), e retalhos autobiográficos.
Em "Os Insolentes" tudo gravita em
torno de Maud Grant-Taneran, uma jovem de 20 anos que vive,
na França rural, a sua primeira crise amorosa, e de
um triângulo sentimental - Maud, Jacques (o seu irmão
mais velho) e a mãe. A família Grant-Taneran
é composta por mais duas figuras - o padrasto de Maud
e o seu irmão mais novo, Henri -, mas a indiferença
a que são votadas no contexto familiar é reproduzida
por Marguerite Duras ao longo da narrativa. A autora prefere
explorar o cariz vampírico de Jacques, que, além
de extorquir dinheiro à família para saldar
as suas dívidas de jogo, apresenta-se como um chantagista
emocional nato, sobretudo com a sua mãe.
Duras entrecruza, então, os jogos
manipuladores de Jacques (que tenta, a todo o custo, driblar
a solidão) com a condescendência da mãe
e o tumulto interior de Maud. Que reaparecerá, por
diversas vezes e sob diferentes nomes, na obra de Duras (romances,
peças de teatro e guiões cinematográficos).
|