Colecção Mil Folhas

1 - O Nome da Rosa
Umberto Eco

2 - O Ano da Morte de Ricardo Reis
José Saramago

3 - Siddharta
Hermann Hesse

4 - O Outono do Patriarca
Gabriel García Márquez

5 - Dona Flor e seus Dois Maridos
Jorge Amado

6 - O Jardim do Éden
Ernest Hemingway

7 - O Deus das Moscas
William Golding

8 - O Homem que Via Passar os Comboios
Georges Simenon

9 - As Vinhas da Ira
John Steinbeck

10 - A Costa dos Murmúrios
Lídia Jorge

11 - Se numa Noite de Inverno um Viajante
Italo Calvino

12 - Paula
Isabel Allende

13 - O Doutor Jivago
Boris Pasternak

14 - Margarita e o Mestre Michail Bulgakov

15 - Se isto é um Homem
Primo Levi

16 - Razões de Coração
Álvaro Guerra

17 - As Ondas
Virginia Woolf

18 - Olhos Azuis, Cabelo Preto
Marguerite Duras

19 - Era Bom que Trocássemos umas Ideias sobre o Assunto
Mário de Carvalho

20 - Um Quarto com Vista
E. M. Forster

21 - Olhos Verdes
Luísa Costa Gomes

22 - Boneca de Luxo
Truman Capote

23 - O Som e a Fúria
William Faulkner

24 - A Lua e as Fogueiras
Cesare Pavese

25 - 1984
George Orwell

26 - Afirma Pereira
Antonio Tabucchi

27 - Morte em Veneza
Thomas Mann

28 - A Obra ao Negro
Marguerite Yourcenar

29 - Gente Feliz com Lágrimas
João de Melo

30 - A Metamorfose
Franz Kafka



Porquê uma colecção de livros?
José Manuel Fernandes

Numa notável crónica editada este domingo no PÚBLICO, Ana Sá Lopes explicava para que serve um jornal. Como é útil para limpar o balcão de vidro de uma pastelaria, por exemplo. Ou para embrulhar a panela do arroz para que este fique solto, como se pretende.
Claro que há muitas outras utilidades que ela não referiu - e pelo menos tão importantes. Forrar o caixote do lixo. Ou embrulhar o peixe, num velho mercado. Ou aconchegar os copos de vidro numa mudança. Ou... por aí adiante.

Uma das coisas que devia fazer a humildade que quem escreve nos jornais é perceber como a sua escrita é efémera, como ao fim de umas horas já há outro jornal para ler, como daqui por uns anos quem quiser saber o que escrevemos terá de mergulhar nos volumes, de páginas amareladas e a desfazer-se, de uma qualquer hemeroteca (estou a esquecer-me dos novos arquivos electrónicos, mas é de propósito: é que não vem a propósito do que vos quero dizer) ou nas prateleiras empoeiradas de um arquivo.

Por isso sempre tive a noção de que um livro é outra coisa - mesmo esses livros fáceis que reúnem crónicas de jornais. Um livro guarda-se numa estante, pousa-se na mesinha de cabeceira, lê-se na cama ou mergulhado numa banheira, folheia-se mil vezes, volta a pôr-se na estante, empresta-se a um amigo, relê-se 20 anos depois - ou 20 dias -, redescobre-se com a sensação de que nunca morre, nunca desaparece.

E, depois, há livros e livros. Os que entram na nossa vida. Os que nos fazem olhar para o mundo de outra maneira - e para nós também. Os que nunca abrimos mas sabemos que estão lá, para quando for preciso. Os que fechamos depois das primeiras páginas para a eles regressar anos passados. Os que nos fazem passar noites em claro.

Para um especialista do imediato e do efémero, como é um jornalista, o livro é de uma outra dimensão - e por isso há qualquer coisa de quase sagrado que sentimos estar a violar quando (como agora o PÚBLICO vai fazer) vamos juntar um livro, uma colecção de livros, a um jornal. Distribuí-los em conjunto. Espalhá-los por milhares de bancas e quiosques. Acreditar que é possível levar assim mais livros, muito mais livros, junto de uma audiência muito mais vasta. Tendo a ousadia de tentar que uma selecção de grandes romances do século passado entrem em casas onde não há livros, ou onde faltam edições com a qualidade das que propomos, ou onde de tanto lidos e emprestados obras como "O Nome da Rosa", ou "1984", ou "O Ano da Morte de Ricardo Reis", ou outro qualquer, já têm folhas a descolar-se. Ou pensando apenas que há livros que se gosta de ter repetidos, que há prazer em olhar para uma estante, fazer uma colecção, acreditar que mesmo que não seja agora que vou ler o que comprei, eu ou alguém pegará um dia naquele livro e com ele viajará (viaja-se sempre nas páginas de um livro, mesmo quando ele não sai na nossa rua).

Não é a primeira vez que o PÚBLICO propõe ao seus leitores colecções de livros, mas nunca antes o fez com o mesmo cuidado de selecção e com tanta qualidade de execução e acabamento. Nem propondo títulos tão recentes e importantes.

Se acreditamos - como acreditamos - que toda a comunicação social é serviço público, se acreditamos - como acreditamos - que tudo o que se fizer pelo livro e pela leitura é um investimento no país e nos portugueses, e que essa é também a nossa obrigação, então esta colecção ainda faz mais sentido.

Durante 30 semanas sabemos que o jornal, às quartas-feiras, não escapará ao seu destino de, lido na voragem de dias apressados, acabar a ser utilizado por alguém que apenas deseja limpar melhor o vidro de uma montra - mas acreditamos que o livro que o acompanha será guardado, coleccionado, folheado, lido, emprestado, usado. Porque vale a pena, porque vale o tempo, porque, no seu conjunto, é uma amostra da cultura do século que passou - e que grande século foi...

O colecionador
Eduardo Prado Coelho

Quando entrei para o Liceu Camões, a grande moda era utilizarmos as tampas das garrafas dos refrigerantes para enchê-las com um fundo de plasticina e colar sobre elas fotografias de jogadores de futebol. Formávamos assim equipas que se confrontavam em jogos improvisados durante os intervalos das aulas. Tratava-se de "jogar às caricas", num ágil e certeiro exercício de piparotes dados com sentido estratégico. Utilizávamos os cromos numerados que iam saindo todas as semanas para serem colados em cadernetas que davam forma à ideia de colecção. Era a caderneta dos jogadores de futebol - como poderia ser a dos grandes artistas musicais ou a dos mais importantes monumentos do mundo. Algo que está na base daquilo que hoje se faz com a compra de jornais. Ou não só: o meu banco envia-me regularmente um saquinho com talheres que tento não perder. A senhora que entra no quiosque onde adquiro os jornais interroga-se sobre se já levou para casa todos os pires a que tem direito. E assim vai o mundo.

Um ponto de partida
Fernando Pinto do Amaral

Uma das primeiras colecções de divulgação literária de que me lembro foi, ainda na infância, a dos "Livros RTP" - constava de 100 títulos, foi editada por finais dos anos 60 e pretendia dar um panorama possível da literatura portuguesa e universal. Embora menos ambiciosa, a ideia de publicar agora estes 30 livros às quartas-feiras, com a edição do PÚBLICO, parece-me louvável e merecedora de aplauso, na medida em que permitirá o contacto de muita gente com um número razoável de obras literárias do século XX.

A melhor receita
Vasco Graça Moura

Esta nova colecção Mil Folhas vem mesmo a calhar numa altura em que se discute um tema como o da televisão "generalista" "versus" televisão "elitista". Na verdade, é generalista ou elitista propor ao grande público autores como Thomas Mann, ou Ernst Hemingway, ou Mário de Carvalho, ou Álvaro Guerra, ou tantos outros? Destinar-se-á a colecção antes de mais à faixa esclarecida dos leitores do PÚBLICO, aos que gostam de ler, aos que têm livros, aos que seguem a actualidade cultural? Ou a sua vantagem estará precisamente em propor livros importantes aos que não têm essas possibilidades, aos que não foram, por educação ou hábito adquirido, devidamente induzidos à prática da leitura, àqueles cuja vida está normalmente divorciada da efervescência dos grandes centros da vida cultural e dos valores que nela vão sendo consagrados?

Eleitos
Eduardo Lourenço

Dois jornais, um italiano, outro português, numa iniciativa mais que louvável, propõem ao seu público habitual uma escolha de livros já clássicos ou aspirando a sê-lo. Como não são explícitos quaisquer critérios dessa escolha - por impossíveis ou inúteis -, os autores apadrinhados por esses jornais são, mais do que escolhidos, "eleitos". No fundo, é bom que assim seja. O arbítrio da eleição, com o seu quê de divino, é menos pretensioso que o de uma escolha que, ao fim e ao cabo, nada justifica se não o arbítrio também divino dessa eleição.