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ABCdário
do Surrealismo
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Com a qualidade e prestígio a que as edições
Flammarion nos habituaram, o PÚBLICO iniciou a 16 de Março
uma pequena enciclopédia organizada de forma alfabética,
antecedida por uma introdução de 20 páginas.
Páginas duplas para os temas mais importantes e essenciais
à compreensão do tema, pequenas notas para os assuntos
mais técnicos ou anedóticos: no “ABCedário
do Renascimento Italiano”, o segundo livro da série,
fala-se de Donatello a Miguel Ângelo, de Maquiavel a Leonardo,
de Piero della Francesca a Boticelli, figuras de um movimento que
mudou a arte e a ciência e se iniciou, simbolicamente, em
1401 em Florença. A aproximação a cada tema,
com um grafismo elegante e explorando fortemente a iconografia,
faz-se sempre de modo triplo: científica, prática
e cultural. Um asterisco assinala as remissões, conduzindo
o leitor de entrada em entrada. A colecção é
escrita por especialista reputados — historiadores de arte
e da literatura, conservadores de museu, arqueólogos, astrofísicos,
geógrafos, etnobotânicos, etc. — que asseguram
a qualidade e o rigor dos textos. Uma cronologia, um índice
e uma bibliografia seleccionada completam o livro, cujo tamanho
permite também a sua utilização como guia num
passeio ou em viagem.
Os livros estarão nas bancas a partir de sábado e
poderão ser comprados com qualquer edição seguinte
do jornal a 4,9 € jornal.
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ABCedário do Surrealismo
Blasfémias permanentes,
amor louco
SURREALISMO, s.m. Automatismo psíquico puro, pelo qual se
pretende exprimir, verbalmente ou por escrito, ou de qualquer outra
maneira, o funcionamento real do pensamento. Ditado do pensamento,
na ausência de qualquer vigilância exercida pela razão,
para além de qualquer preocupação estética
ou moral.
Como entrada de dicionário, é assim definido por
André Breton (1896-1966), no “Manifesto do Surrealismo” (1924),
o alcance da palavra que abrigará todo um movimento. Anos
antes, em 1919, é o mesmo Breton que, com Phillippe Soupault,
lança “Les Champs Magnétiques”, a primeira obra “puramente
surrealista”, onde se põe em prática o princípio
da “escrita automática”, ou seja, o livro é redigido
e publicado sem rasuras nem correcções.
A palavra “surrealismo” é, contudo, antecedida pela palavra “surrealista” usada
originalmente no prefácio a “Les Mamelles de Tirésias”,
escrita por Guillaume Appolinaire, em 1917. Aliás, os surrealistas
irão criar uma linhagem de autores dos quais se dizem herdeiros:
Dante, Sade, Poe, Mallarmé, Raymond Roussel, Lautréamont,
Rimbaud, entre outros. Outras influências vinham de áreas
ligadas ao paranormal, às ciências ocultas (alquimia
e magia) e à psicanálise, sobretudo Freud e os seus
estudos acerca dos sonhos.
Amor, liberdade e poesia é a trindade que pode sintetizar
o modo de existência dos surrealistas. O “amor louco”, que
leva Breton ao conceito de “acaso objectivo”, a “libertação
pelas palavras” — por exemplo, através do “cadavre exquis”,
um dos mais célebres jogos do movimento —, a definição
de poeta como um revolucionário a quem cabe “pronunciar
as palavras sempre sacrílegas e as blasfémias permanentes” (Benjamin
Péret) são alguns dos tópicos desenvolvidos
no âmbito do surrealismo.
Ao longo dos anos foram muitos os escritores e artistas que abraçaram
o movimento: Duchamp, Artaud, Ernst, Bataille, Aragon, Buñuel,
Dali, Picasso, Gracq, Man Ray, Giacometti, Desnos, Miró e
Magritte são alguns dos mais exímios intérpretes
dos exercícios surrealistas. Muitos foram excomungados do
colectivo, outros bateram com a porta com estrondo e seguiram o
seu caminho. Breton foi sempre revendo, até à sua
morte, através de diferentes textos, entrevistas e manifestos,
a ideologia do movimento: “Segundo Manifesto do Surrealismo”(1930), “Prolegómenos
a Um Terceiro Manifesto do Surrealismo ou não” (1942), “Do
Surrealismo em Suas Obras Vivas” (1953).
Contudo, será sempre o manifesto fundador do surrealismo,
o de 1924, aquele que mais decisivamente contribuirá para
a perenidade do movimento: “Querida imaginação, o que
eu amo em ti acima de tudo é que não perdoas.”
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Sabia que... |
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“Les Champs Magnétiques”,
a primeira obra surrealista, foi escrita por André Breton
e Phillippe Soupault, segundo o princípio da escrita automática,
em 1919, no Café de La Source, no Boulevard Saint-Michel,
em Paris.
À meia-noite de 13 para 14 de Novembro de 1925 foi inaugurada,
na Galeria Pierre, em Paris, a primeira exposição
colectiva de artistas surrealistas. A mostra incluía obras
de Hans Arp, Giorgio de Chirico, Max Ernst, Paul Klee, André Masson,
Joan Miró, Pablo Picasso, Man Ray e Pierre Roy.
Antonin Artaud, um dos nomes centrais do surrealismo, foi expulso
do movimento em 1926, depois de ter sido o responsável pelo
Centro de Pesquisas Surrealistas. Em resposta à decisão
de Breton, o poeta lança, no ano seguinte, “À la Grande
Nuit, ou Le Bluff Surréaliste”. |
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