27-11-2003 Tintim volta a pisar a estrada da aventura. Encontra no seu caminho Laszlo Carreidas, o “homem que nunca ri”, e debate-se com os mistérios da parapsicologia Algures no trajecto entre Macassar e Darwin, o jacto particular do milionário Laszlo Carreidas desaparece sem deixar rasto. Além do proprietário, seguem a bordo Tintim e os seus companheiros Haddock e Girassol. Começa assim mais uma movimentada aventura do herói de Hergé, “Voo 714 para Sydney”, que será distribuída amanhã com o PÚBLICO. A história inicia a sua primeira publicação na revista “Tintin” no final de Setembro de 1966, quatro anos depois de o famoso repórter ter desvendado o enigma das jóias de Castafiore na banda desenhada com o mesmo título (“As Jóias de Castafiore”, quinto título da nossa colecção). Desta vez, o herói regressa de novo à estrada da aventura, que decorre no quadrante geográfico situado entre a Indonésia e a Austrália. Tintim reencontra dois velhos conhecidos – o piloto aviador Xyssa e o vilão Rastapopoulos –, que terão destinos diferentes. Mas é a figura de Carreidas, proprietário dos aviões com o seu nome, do refrigerante “Sani-Cola” e outros produtos de consumo, que se impõe claramente na galeria de personagens da história. Hergé prossegue nesta BD o trabalho de desmontagem de algumas das figuras da série, iniciado algumas aventuras atrás, em “Carvão no Porão”. Rastapopoulos é uma delas, Allan Thompson (o ex-adjunto de Haddock a bordo do “Karaboudjan”) é outra. Carreidas também pode ser integrado na lista, mas é sujeito a um tratamento um pouco distinto, pois situa-se num território pouco definido entre o “puro malfeitor” e o “espertalhão” bem sucedido na vida, mas no limite do lado dos “bons”. Ele é, de facto, o primeiro personagem ambíguo – rico e generoso a espaços, mas que não hesita em fazer batota nas circunstâncias mais pueris – numa série onde os papéis estão sempre muito bem distribuídos pelos dois campos: o dos que se encontram ao lado de Tintim e os que se lhe opõem. Além de Carreidas, aparece pela primeira vez Mik Esdanitoff, célebre pelo seu trabalho na revista “Comète”. É uma figura invulgar, que comunica telepaticamente com os restantes personagens da história, inspirada em Jacques Bergier, dinamizador da conhecida revista “Planète” e co-autor de um livro que fez furor nos anos 60, “Le Matin des Magiciens” (em português, “O Despertar dos Mágicos”, edição Bertrand). O interesse de Hergé pela parapsicologia tem aqui um meio de se exprimir, mas evitando ao mesmo tempo qualquer atitude no sentido de convencer os leitores a acreditarem no fenómeno. Com efeito, Hergé faz aparecer um disco voador e Girassol descobrirá no bolso um pedaço de metal desconhecido na Terra, mas resiste à solução demasiado óbvia de mostrar os tripulantes da nave. A amnésia colectiva de que padecem os sobreviventes da aventura
também é de molde a não dissipar as zonas de penumbra
na abordagem do tema. E é um céptico Serafim Lampião,
persistente angariador de seguros que leva Haddock aos arames mais
de uma vez, quem comenta, através da reportagem televisiva,
as improváveis peripécias de uma aventura que acaba onde
começa: com os nossos heróis a apanharem o avião
para Sydney… |