24-10-2003 Tintim e o inseparável Milu estão
a pernoitar no meteorito que caiu nas águas do Árctico,
como se fosse uma ilha, e como se tal fosse possível, quando são
surpreendidos com uma explosão. Uma detonação? Uma
espécie de pequeno vulcão?, interrogam-se. Um ovo?, questiona
um sempre esfomeado Milu, que propõe de imediato fazer uma omelete.
Nada disso. É um cogumelo. E logo outro e mais outro e mais outro,
que se agigantam muito para lá do tamanho de Tintim e, zás,
explodem logo. Tais cogumelos só são possíveis porque
naquele meteorito há um certo metal, o calisténio, com
propriedades estranhas. Já que tudo é possível no
mundo da fantasia, Hergé fez cogumelos crescerem num ápice,
aparecidos, quem sabe, de um esporo que ali foi parar. Embora tudo pareça
mirabolante, nem tudo é absoluta fantasia. Ao pintalgar os cogumelos
brancos com manchas encarnadas, Hergé inspirou-se num cogumelo
que existe de verdade — o amanita-mata-moscas ou, segundo o nome científico,
o “Amanita muscaria”. Só trocou um pouco as voltas à realidade,
porque o amanita-mata-moscas, que é um dos cogumelos mais vistosos
e bonitos, tem o chapéu encarnado com pintas brancas. É também
dos mais venenosos: no século XV utilizava-se o seu suco para
matar moscas. O princípio activo da sua toxicidade é o ácido
iboténico. Se for ingerido, transforma- se no organismo em muscimol,
que ataca sobretudo o sistema nervoso e causa perturbações
de consciência, delírio e alucinações. Por
esta razão, ainda hoje se usa como estupefaciente na Europa de
Leste e noutros países. Embora o seu veneno não implique
necessariamente a morte, a ingestão de uma quantidade mínima
pode tornar-se mortal. Não se pense, porém, que cogumelos
gigantes é coisa que não existe. É certo que não
existem carpóforos — aquilo a que chamamos cogumelos e que, na
verdade, não são senão a parte visível que
os fungos necessitam para a sua reprodução — como o imaginado
por Hergé. Mas os cogumelos não se resumem apenas ao que
está à vista. Os carpóforos, cuja presença é mais
ou menos breve no habitat, nascem do micélio, que são filamentos
delgados, incolores ou esbranquiçados, que se ramificam debaixo
da terra. É aqui que os cogumelos podem reservar uma grande surpresa.
O maior organismo que vive na Terra é um cogumelo e não,
como muitos pensam, as baleias-azuis, com cerca de 30 metros de comprimento.
Em 2000, descobriu-se o micélio de um exemplar de armilária — o “Armillaria
ostoyae”, conhecido vulgarmente como cogumelo-de-mel, que se estende
por 890 hectares, na Floresta Nacional de Malheur, no Oregon, Estados
Unidos. Nem Hergé imaginou tanto. |