10-10-2003
Um osso gigante para Milu

Teresa Firmino

Como qualquer cão que se preze, Milu gosta de ossos. E se tiver fome, qualquer um serve, nem que sejam os das caveiras a assinalar corrente de alta tensão. Mas a sorte grande saiu-lhe quando passou em frente do Museu de História Natural da Sildávia. Aos pinotes na rua, com um osso maior que ele, pode adivinhar-se o que roubou. “Sabes, Tintim, neste país têm ossos magníficos.” Depressa se descobre qual o osso magnífico que abocanhou, quando o olhar estupefacto do guarda do museu pára na pata dianteira de um dinossauro, um “Diplodocus gigantibus”. Não é que o episódio do dinossauro seja fundamental em “O Ceptro de Ottokar”, mas serve a Hergé para construir a narrativa. Sendo os ossos tão importantes no imaginário de Milu, o amigo de Tintim irá deparar-se com um dilema nesta aventura de busca do ceptro. Na altura em que o recupera, dá de caras com outro osso e tem de optar. Leva-o? Ou leva o ceptro? A visão de um Tintim furioso fá-lo decidir-se. Hergé podia ter construído a história de outras maneiras, mas o episódio do dinossauro exemplifica o seu interesse pela ciência. Não é o único. Os dinossauros fascinam as crianças e há adultos muito empenhados na procura de fósseis. A dinomania, presente desde filmes a brinquedos, começou pouco depois de os cientistas perceberem que na Terra viveram uns répteis enormes, há muito tempo. Quem lhes pôs o nome foi o britânico Richard Owen, em 1841, por serem muito diferentes dos répteis actuais — “dinossauro” significa “lagarto terrível”. Mas a descoberta de ossos gigantes começou muito antes. Não se sabia é que eram de dinossauros. Em 1676, o clérigo Robert Plot, da Universidade de Oxford, ilustrou parte de um osso da coxa que se pensava ser de um humano gigante. As primeiras descobertas de fósseis bem documentadas foram em 1807-1809, na Grã-Bretanha. Mas primeiras descrições de verdadeiros dinossauros, por Gideon Mantell e William Buckland, fizeram-se nos anos 20 do século XIX. Anos depois entrou em cena Owen. Ainda seria no século XIX, em 1878, que Charles Marsh descreveu o primeiro “Diplodocus”, encontrado nos EUA, fósseis deste animal que viveu há 150 milhões de anos. Era bicho para ter 26 metros de comprimento e 15 toneladas, suportadas pelas enormes patas dianteiras. Aquelas que Milu cobiçou. Não houve nenhum “Diplodocus gigantibus”. Houve o “Diplodocus longus”, o “carnegiei” e o “hayi”. Nem Milu teria força para abocanhar-lhes as patas. Transformaram-se em pedra, na fossilização, ao longo de milhões de anos. Pobre Milu.