26-09-2003
Desolação magnífica

Teresa Firmino

São famosíssimas as primeiras palavras de Neil Armstrong mal assentou os pés nas poeiras da Lua. “É um pequeno passo para o homem, um salto gigante para a humanidade”. As palavras de Tintim, no álbum “Explorando a Lua”, não têm a mesma grandiosidade, pode até dizer-se que são de uma banalidade óbvia. “Já está! Andei alguns passos! Sem dúvida, pela primeira vez na história da Humanidade, alguém caminhou na Lua!” Mas o que disse Tintim quando a porta do foguetão se abriu e, já com o fato espacial enfiado, se deparou com a paisagem lunar à sua frente, até não anda muito longe das palavras do segundo homem (de carne e osso) na Lua. “Oh! Que espectáculo alucinante!”, saiu a Tintim. “Uma desolação magnífica”, chamou Buzz Aldrin ao solo que acabava de pisar, em Julho de 1969.

O primeiro homem dos quadradinhos a pisar o solo lunar também proferiu, com uma antecipação de 15 anos, a palavra “desolação”. Ainda a olhar a Lua pela porta do foguetão, Tintim deixa-se ir em pormenores descritivos: “Como hei-de descrever-vos isto? Uma paisagem de pesadelo, uma paisagem de morte, assustadora pela desolação… Nem uma árvore, nem uma flor, nem a mais pequena erva… Nem um pássaro, nem um ruído, nem uma nuvem. No céu, de um negro retinto, há milhares de estrelas…”

Não ficou para a história, mas Aldrin também lançou uma frase – pertinente, diga-se – quando se preparava para descer do módulo lunar Eagle e ir ter com Armstrong. “Agora vou fechar parcialmente a escotilha; quero ter a certeza de que não ficamos trancados do lado de fora”. “Ora aí está uma boa ideia!”, respondeu-lhe Armstrong.

Não foi só Hergé que se dedicou a imaginar o que seria dito na Lua, se um dia alguém lá fosse. Nos Estados Unidos chegou a haver apostas sobre quais seriam as primeiras palavras de Armstrong. Havia quem garantisse que rezaria um Pai-Nosso e outros avançavam hipóteses mais pragmáticas: “Não está cá ninguém”; “E agora?”; “Onde é que vou espetar esta bandeira?”

Espetou-se uma bandeira, de facto. E o cenário onde essa aventura aconteceu, que não foi fácil — à falta de vento, houve que fingir que esvoaçava com um suporte, o pau da bandeira não se enterrava e ela acabou por tombar —, foi o Mar da Tranquilidade. O foguetão de Tintim e dos seus companheiros pousou no circo Hiparco, uma planície circular rodeada por uma barreira de montanhas entre mares com nomes igualmente tranquilizadores: o Mar das Nuvens, o Mar do Néctar e o Mar dos Vapores.